UMA REVISTA ELETRÔNICA QUE FOCALIZA O GÊNERO WESTERN

17 de janeiro de 2017

FLECHAS DE FOGO (BROKEN ARROW) – WESTERN QUE RESPEITOU OS APACHES


Robert Taylor; Richard Dix
“Flechas de Fogo”, dirigido por Delmer Daves, é geralmente considerado o precursor dos westerns que trataram os índios com dignidade. Porém é importante ressaltar que “A Passagem do Diabo” (Devil’s Doorway), de Anthony Mann com Robert Taylor foi filmado praticamente ao mesmo tempo de “Flechas de Fogo” e igualmente mostra os nativos norte-americanos de modo simpático, ambos os filmes rodados em 1949 e somente lançados em 1950. O público havia se acostumado com a espécie de lavagem cerebral que o cinema praticava colocando os índios sempre como vilões cujas mortes se faziam necessárias para conter a selvageria dos peles-vermelhas. Outro registro digno de nota é lembrar que muito antes Hollywood já rompera com o provérbio atribuído ao General Philip Sheridan que ‘O único índio bom é um índio morto’. Em 1925 Richard Dix como o índio ‘Nophaie’ estrelou “Alma Cabocla” (The Vanishing American) e em 1932 foi a vez de “O Fim da Trilha” (The End of the Trail), com Tim McCoy mostrar os índios com simpatia. O mesmo ocorreu claramente em “O Intrépido General Custer” (They Died with their Boots On) e em “Sangue de Heróis” (Fort Apache), respectivamente de 1941 e 1948 e dirigidos por Raoul Walsh e John Ford e nos quais sem condescendência os nativos são vistos como bravos guerreiros dignos de respeito. Mas foi sem dúvida o western de Delmer Daves que originou a série de filmes revisionistas que mudou a visão histórica do cinema sobre os índios.


James Stewart com Jeff Chandler
e com Jay Silverheels (abaixo).
Conhecendo melhor os Apaches - O roteiro de “Flechas de Fogo”, de autoria de Albert Maltz, baseou-se na história “Blood Brother”, escrita por Elliott Arnold contando como se deu a amizade entre Tom Jeffords (James Stewart) e o chefe Apache Cochise (Jeff Chandler). Jeffords é um ex-oficial da União que cavalga pelo Arizona em busca de ouro ou prata. Encontra um jovem índio ferido e cuida dele, salvando-o da morte certa e isto faz com que Jeffords consiga chegar até Cochise com quem faz amizade. Entre os Apaches Jeffords se enamora de Sonseeahray (Debra Paget), com quem vem a casar com o consentimento de Cochise. Jeffords passa a se empenhar pela paz entre Apaches e os homens brancos, o que interessa a Washington que envia ao Arizona o General Oliver Howard (Basil Ruysdael) para essa missão pacificadora. Cochise é partidário de acordo que sele a paz definitiva, mas ocorre que tanto do lado dos Apaches como dos brancos invasores de seus territórios há grupos contrários ao acordo. Jerônimo (Jay Silverheels) lidera o rompimento com Cochise promovendo ataques a diligências e roubo de gado, enquanto Ben Slade (Will Geer) comanda brancos insatisfeitos que querem a morte de Cochise. Sonseeahray morre numa emboscada preparada para matar Cochise, morrendo também Slade, ficando o exemplo deixado por Jeffords e Cochise apontando que a paz seria sim possível.

Will Geer, Jeff Chandler e James Stewart
A paz suspeita - Albert Maltz foi um dos dez roteiristas que entraram para a lista negra do Macarthismo, sendo preso e proibido de trabalhar. Antes disso deixou pronto o roteiro de “Flechas de Fogo” que corajosamente foi produzido por David O. Selznick para a 20th Century-Fox, chocando inicialmente público e crítica ao mostrar a cultura Apache, seus valores e nobreza de caráter através do chefe Cochise. Indispondo-se com parte de seus bravos que não aceitavam a paz pois ela não vingava os milhares de irmãos mortos pelos brancos, Cochise entendia que a continuidade da luta fatalmente levaria os Apaches à extinção. Para ele a paz era a única saída, ainda que os gananciosos invasores das terras onde viviam os nativos, com a ajuda da Cavalaria, trouxessem dúvidas se aquela seria mesmo a melhor opção. A amizade com Tom Jeffords e mais tarde com o General Howard, também chamado ‘General Bible’ (Bíblia), fez com que Cochise decidisse pela paz. Repleto das melhores intenções, o western de Daves não consegue levar às últimas consequências um dos aspectos mais importantes do filme que é a miscigenação que ocorreria com o casamento entre Tom Jeffords e a jovem índia Sonseeahray. Consumado o enlace segundo o ritual Apache, mesmo com um discurso sobre a temeridade da união que jamais seria aceita pelos brancos, Sonseeahray vem logo a ser morta, o que atenua a força do roteiro. Em “Renegando Meu Sangue” (Run of the Arrow), que Samuel Fuller dirigiu em 1957, o personagem de Rod Steiger se casa com a índia Sioux interpretada por Sara Montiel (quem não se casaria), com ela ficando ao final do filme. Mas talvez isto demorasse mais a acontecer se “Flechas de Fogo” não tivesse abordado esse difícil tema.

James Stewart e Basil Ruysdael

Jeff Chandler
O Cochise do moreno Jeff Chandler - Quase inteiramente filmado nas belas paisagens do Arizona, a fotografia é um dos pontos altos deste western, ao lado da eficiente música de Hugo Friedhofer pontuando as ações. As sequências envolvendo confrontos entre Apaches e brancos se resumem a rápidas emboscadas praticadas por renegados índios e homens brancos de má índole. Cochise mesmo é mostrado como homem sábio, ponderado e longe de ser um guerreiro e isso é evidenciado pela imutável expressão de Jeff Chandler, filmado muitas vezes de baixo para cima para melhor afirmar sua grandeza de chefe Apache. Chandler personifica um dos Apaches mais ‘clean’ que o cinema mostrou, contrastando mesmo com James Stewart, este ainda não o homem do Oeste perfeito que se tornaria na excepcional quina de westerns em que atuou sob a direção de Anthony Mann nessa mesma década. Jeff Chandler, novaiorquino filho de judeus e que curiosamente tinha pele morena, voltaria a interpretar Cochise no filme “O Levante dos Apaches” (The Battle at Apache Pass), em 1952, antes de se tornar um dos galãs preferidos de Hollywood. Indicado para o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante por sua interpretação como o chefe Apache, Chandler perdeu o prêmio para George Sanders (“A Malvada”) e o que intriga é que Chandler como Cochise mantém durante todo o filme o mesmo semblante, sem nenhum momento de maior dramaticidade. “Flechas de Fogo” concorreu ainda nas categorias de Melhor Roteiro (Albert Maltz) e Melhor cinematografia (Ernest Palmer), perdendo em ambas e seria inimaginável a Academia premiar, em 1951 a um ‘blacklistado’ como Maltz.

Debra Paget com James Stewart
Casamento Apache - O romance neste western pró-índio se passa entre James Stewart (com sua já inseparável peruca aos 41 anos de idade) e a ainda adolescente Debra Paget no frescor dos seus 16 anos de idade e como não poderia deixar de ser, romance pouco convincente. Muito bonita, Debra sorri o tempo todo iluminando a tela com sua beleza e apenas isso. Uma pena que justamente essa subtrama, que poderia ser até mais importante que o tema principal do filme, tenha um desfecho imposto pela moral então vigente em Hollywood, moral que não aceitaria ver um de seus mais representativos astros ser parte de uma provocativa miscigenação. As sequências de romance entre Stewart e Debra, incluída a cerimônia de casamento Apache, são para dizer o mínimo, mornas. Com um elenco de apoio com coadjuvantes do nível de Arthur Hunnicutt, John Doucette e Will Geer, o filme os desperdiça em aparições pequenas, no caso de Hunnicutt e Doucette insignificantes mesmo. Menos mal o aproveitamento de Jay Silverheels quando se preparava para assumir a identidade de ‘Tonto’ na série ‘The Lone Ranger’ para a TV. O canadense Silverheels tem rara oportunidade de uma interpretação dramática como Gerônimo, o Apache que não aceita a submissão de Cochise às propostas de paz dos bracos.

Jay Silverheels; Debra Paget e James Stewart

Delmer Daves
Estimado clássico pró-índio - Por abordar diretamente um tema quase ignorado pelo cinema norte-americano que é mostrar o índio e sua cultura de modo respeitoso e os brancos como vilões verdadeiros na História, “Flechas de Fogo” merece a importância adquirida e ter se tornado um clássico no gênero. Gerou inclusive uma série de TV intitulada “Cochise” protagonizada por Michael Ansara e com John Lupton como Tom Jeffords, série que ficou no ar por três temporadas. Os anos e westerns seguintes reservavam tanto para Delmer Daves como para James Stewart filmes melhores que este bom e bastante estimado “Flechas de Fogo”.


1 de janeiro de 2017

QUELÉ DO PAJEÚ, O DESAPARECIDO NORDESTERN DE ANSELMO DUARTE


Lima Barreto e
Anselmo Duarte
Lima Barreto, o cineasta, era também escritor e um de seus livros foi “Quelé do Pajeú”, que Lima tencionou levar ao cinema. Excêntrico e de temperamento difícil, o que se refletiu em dificuldades de produção em todos seus projetos inclusive no bem sucedido artística e comercialmente “O Cangaceiro”, Lima Barreto viu fracassar a tentativa de transformar “Quelé do Pajeú” em filme. Escreveu o roteiro e com ele debaixo do braço saiu em busca de financiamento, mas aos 63 anos de idade e cada vez mais irascível, viu todas as portas se fecharem. O roteiro de Lima Barreto chegou às mãos de Anselmo Duarte que leu e imediatamente se interessou em filmá-lo, impondo a condição de fazer algumas alterações na história, com o que a princípio Lima concordou. O terceiro filme de Anselmo Duarte, “Veredas da Salvação” (1965) não havia repetido o êxito comercial de “O Pagador de Promessas”, mas mesmo assim Anselmo conseguiu apoio financeiro de pessoas físicas e jurídicas. Além do Instituto Nacional do Cinema (INC), nada menos que sete bancos decidiram investir no projeto, assim como gente conhecida como o colunista social Ibrahim Sued e o crítico carioca Carlos Fonseca. Com um bilhão de cruzeiros para seu novo projeto, Anselmo Duarte não teve dificuldades em contratar Tarcísio Meira, já então mais famoso galã da televisão e a atriz Izabel Cristina (que mudou o nome para Guy Loup) igualmente conhecida, além de Jece Valadão e Rossana Ghessa para os principais papéis. Lima Barreto pretendia filmar “Quelé do Pajeú” no sertão pernambucano buscando maior autenticidade, mas Anselmo levou a equipe para a sua cidade natal, Salto de Itú, uma espécie de Alabama Hills cabocla, onde o filme foi quase inteiramente rodado.


Tarcísio Meira e Elizângela Vergueiro;
Tarcísio com Rossana Ghessa.
Juramento de vingança - O nome de Lima Barreto consta nos créditos como autor da história e co-roteirista, mas Lima deu várias entrevistas mostrando-se inconformado com as alterações feitas por Anselmo Duarte que teriam desvirtuado seu texto original. No filme Quelé do Pajeú é o apelido dado pelo Capitão Virgulino Ferreira, o Lampião (Luiz Alberto Meirelles), ao vaqueiro Clementino Celidônio (Tarcísio Meira) que certo dia retorna para casa e se depara com uma tragédia. Um forasteiro com uma cicatriz na testa e sem o dedo mindinho da mão direita após agredir a mãe de Clementino (Anita Isbano) violenta sua irmã Marizolina (Elisângela Vergueiro). Quelé jura vingança e sai à procura do desconhecido e entre as pessoas que encontra nessa busca está Maria Rita (Izabel Cristina) e o bando de Lampião. Mais tarde Quelé conhece a jovem Maria do Carmo (Rossana Ghessa) que por ele se apaixona e que passa a acompanhá-lo. Finalmente Quelé se depara, na cidade de Imbé, com Cesídio da Costa (Jece Valadão), o homem que desgraçara sua família, justamente no dia em que Cesídio vai se casar. Quelé faz o noivo seu prisioneiro e o obriga a acompanhá-lo até seu sítio em Pajeú das Flores, bem como um padre (Sergio Hingst) a quem ordena que case Cesídio com Marizolina que engravidara após o estupro sofrido. Em Imbé Quelé havia matado um cabo ao se defender da polícia local e é perseguido por uma patrulha. A milícia cerca seu sítio mas Quelé, ajudado por Cesídio, defende-se trocando tiros com a força policial. Cesídio morre no tiroteio e Quelé está prestes a ser morto quando surge um bando de cangaceiros comandado por Lampião dizimando a milícia. Sabedor que será procurado pela Justiça, Quelé se torna mais um cabra do bando de Lampião, vendo Maria do Carmo, grávida de seu filho, ser morta por um tiro disparado pelos ‘macacos’ de uma volante.

Jece Valadão; Luiz Alberto Meireles e
Jorge Karam.
O nordestern de Anselmo Duarte - Em suas pesquisas sobre o cangaço, Lima Barreto descobriu que existiu um pernambucano chamado Clementino Furtado, apelidado de Quelé, e que após ter participado do bando de Lampião, tornou-se policial. Atingindo o posto de sargento, Quelé foi um dos mais tenazes perseguidores de cangaceiros, comandando uma volante conhecida como ‘Coluna Pente Fino’, responsável pelo extermínio de dezenas de cangaceiros. Sargento Quelé, que era lembrado como ‘a valentia em pessoa’ veio a falecer de morte natural em 1955 e inspirou Lima Barreto a criar o personagem protagonizado por Tarcísio Meira. No mesmo ano em que foi produzido “Quelé do Pajeú’, Glauber Rocha filmou seu “O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro”, ambos autênticos nordesterns, ou seja, faroestes ambientados no sertão nordestino mas com diferentes pretensões estéticas. Glauber, que viajava bastante, conhecia a nova linguagem dos westerns produzidos na Europa, cujos expoentes eram Sergio Leone e Sergio Corbucci. Anselmo Duarte, por seu lado, tinha “O Cangaceiro” e o ciclo que se desenvolveu posteriormente sobre o cangaço, como modelos para seu novo filme. Glauber era uma espécie de unanimidade para a crítica, sendo seu novo filme com o personagem Antônio das Mortes saudado como obra de gênio. Sem a mesma repercussão na imprensa, Anselmo Duarte com “Quelé do Pajeú” realizou um dos melhores exemplares do gênero nordestern.

Rossana Ghessa, Sergio Hingst, Jece Valadão e
Tarcísio Meira; Luiz Alberto Meireles;
Desafio à ditadura militar - Tecnicamente muito bem produzido, sendo o primeiro filme nacional em 70 mm e som estereofônico, “Quelé do Pajeú” reafirma o inegável talento de seu diretor. Anselmo imprimiu ritmo quase perfeito à odisseia de Quelé na consecução de sua vingança, alternando cenas de ação, romance e sensualidade sem deixar de observar os aspectos religiosos, mesmo o fanatismo tão comum ao homem simples. A história ganha nuances que desafiam os costumes tidos como normais a exemplo da inusitada vingança de Quelé ao obrigar Cesídio, retirado do altar de uma igreja em seu casamento, para se casar com sua irmã, o que é visto com naturalidade por todos. Mesmo Cesídio tem direito a explicar que nada demais fez a não ser cumprir seu dever de macho e ninguém melhor que Jece Valadão para usar essa tese. Sem qualquer compromisso com a defesa da ordem legal, cangaceiros são mostrados simpaticamente, dividindo com o povo o produto dos saques praticados, ainda que por vezes pratiquem alguns excessos abusando de suas vítimas. Nunca mostrados como bandidos, mas sim como gente alegre, valente e justa, os cabras liderados pelo Capitão Virgulino Ferreira vencem sempre as forças policiais organizadas fazendo de “Quelé do Pajeú” um filme desafiador no mais grave momento da ditadura militar no Brasil. Ao final, vendo sua mulher grávida ser morta pelas forças do governo, Quelé segue sua vida ao lado dos cangaceiros em busca de justiça social. Ainda bem que os rigorosos censores cochilaram e o filme de Anselmo Duarte foi exibido normalmente, por algum tempo...

Tarcísio Meira e Jece Valadão
Sequências antológicas - O maior defeito de “Quelé do Pajeú”, por sinal comum em nosso cinema, é transformar pessoas simples em filósofos capazes de expressar frases de grande profundidade. Quelé fala só o suficiente e no linguajar típico de sua gente, mas outros personagens como Maria do Carmo, Cesídio, Maria Rita e até o guarda do quarteirão (Simplício) são cansativos com suas falas recheadas de alcance psicológico quando não metafísico. Queixosa com a quase mudez de Quelé, Maria do Carmo lhe diz: “Já não basta o silêncio do deserto que parece sem vida...”. Se Anselmo Duarte não soube evitar esse tipo de armadilha, por outro lado apresenta em seu filme sequências que merecem fazer parte de qualquer antologia do nosso cinema. Maria do Carmo rejeitada por Quelé monta o cavalo e se excita durante a cavalgada até atingir o orgasmo numa sequência de extraordinária beleza e sensualidade. A luta entre Quelé e Cesídio, inicialmente com facão e punhal, depois com pedaços de madeira e terminando com punhos é excepcionalmente bem coreografada e sem o uso de dublês, em outro momento supremo deste filme. Quelé demonstrando sua coragem e Lampião aceitando o desafio e arriscando a vida “...seja o que Deus quiser...” para reafirmar sua macheza é também uma sequência admirável.

Rossana Ghessa

Geraldo Vandré e Izabel Cristina
Trilha sonora inferior - A trilha sonora musical de “Quelé do Pajeú” foi composta por Marconi Campos, Hilton Acioli e Théo de Barros, sendo executada pelo Trio Marayá, formado por Marconi, Hilton e Behring Leiros, todos maranhenses. Esses músicos acompanharam Geraldo Vandré nas apresentações das canções “Disparada” e “Ventania”, que Vandré levou aos festivais da TV Record. Porém as canções utilizadas no filme não possuem a força destas citadas ou de outras compostas por Vandré, deixando o espectador durante o filme todo à espera de uma canção mais vigorosa, o que não ocorre, não propiciando, assim, maior força dramática às imagens capturadas pelo cinegrafista José Rosa. Uma pena mesmo, ainda mais porque consta que Geraldo Vandré tenha participado como ator sem que possa ser identificado com maior certeza. Essa e muitas outras dúvidas cercam “Quelé do Pajeú”, dúvidas que infelizmente não podem ser esclarecidas visto que a maior parte dos participantes desta produção já faleceu. A atriz Isabel Cristina, ou Guy Loup, que há anos reside na França, seria uma fonte fidedigna, assim como o próprio Vandré e Rossana Ghessa.

Tarcísio Meira; Simplício e Izabel Cristina.
Tarcísio Meira como sertanejo - Aos 34 anos Tarcísio Meira protagonizou brilhantemente o personagem principal deixando longe sua imagem de galã para interpretar o sofrido Quelé. Jece Valadão igualmente excelente não precisando se esforçar muito para compor mais um canalha na extensa galeria de tipos que viveu no cinema, se bem que seu personagem Cesídio termina por se redimir e lutar ao lado de Quelé. A linda Rossana Ghessa, italiana de nascimento, era uma resposta do cinema brasileiro a Claudia Cardinalle e sai-se bem como Maria do Carmo, personagem completamente diferente das tantas que se acostumou a interpretar mas com igual poder de sedução. E sensualidade é o que não falta também à bonita Izabel Cristina, em papel menor. Elizângela, aos 14 anos é Marizolina, ela que teve seu auge como mulher sensual nas novelas nacionais. Sergio Hingst, eficiente como de hábito completa o elenco central que tem um Lampião alourado e sem os óculos característicos. Jorge Karam é um dos cangaceiros e Simplício (Francisco Flaviano de Almeida) tem participação pequena mas cansativa o suficiente superatuando desnecessariamente. Anselmo Duarte era muito bom na direção de atores mas acabou deixando Simplício se exceder. Regina Duarte paris, a filha de Anselmo Duarte faz uma ponta como a noiva de Cesídio.

Rossana Ghessa, Elizângela Vergueiro, Jorge Karam e Sergio Hingst

Tarcísio Meira; Tarcísio e Rossana Ghessa.
Filme descoberto 40 anos depois - Uma vinheta do Canal Brasil diz assim: “O que seria do Brasil sem... o Canal Brasil”. De fato, haveria uma lacuna impossível de ser preenchida pois entre as dezenas e dezenas de produções nacionais rodadas sob os auspícios da Lei Rouanet, o Canal Brasil nos presenteia com um filme como “Quelé do Pajeú” e outros clássicos do nosso cinema. Nossa produção cinematográfica sempre lutou por espaço nas salas exibidoras, como foi o caso deste filme de Anselmo Duarte que permaneceu por seis semanas em cartaz no Cine Windsor. Já a imensa maioria das dezenas (ou centenas) de filmes que o Brasil produz neste novo século são exibidos apenas nas madrugadas do Canal Brasil. A incúria dos donos da nossa cultura permitiu que “Quelé do Pajeú” fosse dado como desaparecido por 40 anos pois não se sabia da existência de uma única cópia sequer. E disso se aproveitou bem Anselmo Duarte que gostava de dizer que seu melhor filme era exatamente “Quelé do Pajeú”, aquele que ninguém mais podia assistir. E uma lenda se criou em torno dessa obra até que um certo Paulo Wenceslau Duarte, descobriu na Europa uma cópia em muito bom estado. Essa cópia foi a exibida na Itália pois contém legendas em Italiano e, ainda bem, foi resgatada e apresentada como presente de Natal em 2016 pelo Canal Brasil. Anselmo Duarte estava certo ao falar bem de “Quelé do Pajeú”, um grande filme, sem dúvida, mas aquém da poética simplicidade de sua obra-prima “O Pagador de Promessas”.